sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Solidariedade, amizade ou instinto?

Essa semana eu estava no metrô e quatro crianças que pareciam moradores de rua estavam no mesmo vagão que eu. Todos estavam com roupas velhas, sujos e descalços, porém pareciam se divertir com a necessidade de se esconder dos guardinhas do metrô.

Eles agachavam, se escondiam debaixo dos bancos, sentavam do lado das pessoas para fingir que estavam juntos, qualquer coisa para não chamar a atenção dos funcionários quando o trem chegava na estação. Quando um deles se sentou ao meu lado eu perguntei onde eles estavam indo, aí ele me respondeu: "Estamos indo pro Jabaquara". Mas pra quê? "Pra pedir". Rapidamente um outro menino corrigiu e disse que eles iam pra Luz.

Quando estávamos saindo da estação Tiradentes, um rapaz parou na frente da porta do trem com um pacote de bolachas em uma mão e uma lata de coca-cola na outra. Os meninos olharam pra ele quando ele passou, mas não por causa do que ele estava comendo, só porque passou mesmo, mas dava pra ver a fome no olhar deles. Duas bolachas depois, o menino que continuava sentado do meu lado ouviu do rapaz das bolachas: "você quer?".

Feliz pela oferta o menino aceitou na mesma hora o pacote com uma bolacha. Isso mesmo UMA bolacha! Só para constar, as crianças entraram no trem comigo na estação Tucuruvi, ou seja, o rapaz com as bolachas quando entrou no vagão já havia visto os meninos lá. Provavelmente entrou comendo, e comeu mais duas bolachas enquanto o trem andava entre Tiradentes e Luz. Ah, mas ele deu a bolacha pro menino mesmo sem ele pedir. Sim, mas tinha mais três meninos na mesma situação, ele não podia ter guardado quatro bolachas pra eles?

O garoto com a bolacha na mão deu uma mordida pequena e então ofereceu aos seus amigos. Dois deles aceitaram e um não quis. Eles desceram na Luz para pedir no trem. Foi então que duas mulheres começaram a comentar o caso. "Você viu que bonitinho, o menino dividiu a bolacha com os outros. Se fosse eu comeria sozinha", disse a primeira. "Eu também não ia repartir não, imagina, estou morrendo de fome e vou dividir uma bolacha com os outros?", completou a amiga.

Olha, eu já achei um absurdo o cara dar uma bolacha só pro moleque, porque é claro que ele vai dividir com os outros, eles estão juntos precisando comer. Mas o maior absurdo é acharem que aquilo foi caridoso, ou um ato bonito do menino que ganhou a bolacha. Olhe para os animais. Todos eles repartem os alimentos. Lembra dos índios. Eles também dividem a caça, independente de quanta comida tenham e quantas pessoas para comer, é instintivo.

Porém nós fomos criados para sermos egoístas, para não dividir. É triste saber que só se repara no menino dividindo uma bolacha para quatro e que o rapaz com 15 bolachas que deu uma só para quatro meninos seja considerado solidário e não cruel. Porque pra mim é crueldade dar uma bolacha, era melhor não dar nada.

Se eu dei alguma coisa para os meninos no lugar de ficar falando mal do cara que deu uma bolacha? Não, não dei nada, também não tinha nada pra oferecer, infelizmente...